Do sonho à realidade: o fracasso do Quadrado Mágico
Jamais o campeão da Copa das Confederações levou também o Mundial seguinte. Em 2005 essa "maldição" ainda não era tão forte. O título brasileiro na já finada competição, após histórica vitória sobre a Argentina na decisão por 4 a 1, elevou a confiança da torcida a um grau máximo.
Os passos seguintes que contribuíram decisivamente para o oba oba geral na Copa de 2006 foram a terrível preparação em Weggis, na Suíça, e o ineficiente, porém sempre lembrado com um equivocado saudosismo, Quadrado Mágico.
Afinal, quem não gostaria de contar com Kaká, Ronaldinho Gaúcho, Adriano e Ronaldo em um mesmo time? O Brasil, comandado por Carlos Alberto Parreira, teve, mas por pouco tempo - e isso, certamente, foi um dos motivos para seu fracasso.
As lembranças do torcedor recaem muito mais no individual desses jogadores, porque como equipe, analisando o coletivo, jamais funcionaram juntos em alto nível.
Início do sucesso
A trajetória vitoriosa da seleção rumo à Copa do Mundo na Alemanha começou com a emocionante decisão da Copa América de 2004. Na ocasião, o gol de Adriano aos 48 minutos do segundo tempo garantiu o empate em 2 a 2. Nos pênaltis, vitória por 4 a 2.
O time ainda era muito diferente daquele que Parreira levaria para a disputa da Copa das Confederações. Na prática, ele não conseguiu convocar a equipe ideal para o torneio.
"O Ronaldo alegou problemas particulares que o impedem de se dedicar à seleção brasileira no momento. Então a comissão técnica resolveu liberá-lo", explicou o técnico da seleção brasileira ao site da CBF. O atacante havia se separado há poucos dias de Daniela Cicarelli e queria ter férias no meio do ano. "Eu já fui em todas as competições da seleção brasileira, e não estou chegando agora pedindo para jogar só a Copa do Mundo", afirmou Ronaldo, em declaração publicada na Folha de S.Paulo à época.
Cafu e Roberto Carlos, veteranos das duas laterais da seleção, foram poupados, já que o treinador queria observar mais outras opções. A primeira fase foi complicada, com vitória sobre a Grécia por 3 a 0, derrota para o México por 1 a 0 e empate com o Japão em 2 a 2. Na semifinal, boa atuação e triunfo por 3 a 2 sobre a Alemanha.
Dida, Cicinho, Lúcio, Roque Júnior e Gilberto; Emerson, Zé Roberto, Kaká e Ronaldinho; Robinho e Adriano. Foi com esse time que o Brasil entrou em campo no dia 29 de junho de 2005, no Waldstadion, em Frankfurt, e goleou os argentinos com com dois de Adriano, um de Kaká e um de Ronaldinho. O Quadrado Mágico ainda não tinha Ronaldo.
"Não precisamos definir nada a nove meses da Copa. Mas, sendo bem transparente, eu imagino que, com Kaká na direita e Ronaldinho na esquerda, teríamos Ronaldo, Adriano e Robinho para definir quem formará a dupla, dependendo de quem estiver melhor". Essas palavras foram ditas por Carlos Alberto Parreira ao programa Bem Amigos, do Sportv, em setembro.
Ou seja, a empolgação em torno da seleção se dava quase que exclusivamente pelo talento individual dos jogadores. A nove meses do principal objetivo, ainda não era possível avaliar o desempenho dos jogadores juntos. Apenas na imaginação e no sonho do torcedor.
A primeira vez
Muita coisa é inventada com o passar do tempo e ganha ares de verdade. O Quadrado Mágico foi utilizado apenas em quatro jogos oficiais e dois amistosos durante o ciclo da Copa de 2006. Jamais fez parte de todo planejamento da equipe, até porque os momentos vividos pelos atletas eram muito diferentes também.
Kaká, Ronaldinho, Adriano e Ronaldo começaram uma partida pela primeira vez juntos em 12 de outubro de 2005, no 3 a 0 sobre a Venezuela em Belém, último compromisso do Brasil - já classificado - pelas eliminatórias. Os dois últimos marcaram e Roberto Carlos completou o placar.
Depois disso, foram utilizados desde o início novamente apenas nos dois amistosos pré-Mundial, já na Suíça, contra a amadora seleção de Lucerna (8x0) e Nova Zelândia (4x0). A empolgação a essa altura, em pleno carnaval que se tornou Weggis, já era enorme.
Apesar do enorme saldo positivo nos três jogos com o Quadrado Mágico até a Copa, a fragilidade dos adversários era evidente. Assim como a falta de entrosamento entre os jogadores e a ausência de encaixe tático dos quatro.
Pobre Mundial
A vitória por 1 a 0 na estreia contra a Croácia foi recheada de críticas. O bom futebol não apareceu, o Quadrado Mágico não rendeu e, inclusive, foi desfeito aos 25 minutos do segundo tempo, com a entrada de Robinho no lugar de Ronaldo. Kaká marcou o único gol aos 44 da etapa inicial.
Robinho merece ser mais citado. Na prática, o bom rendimento da seleção antes do Mundial aconteceu quando o atacante, então no Real Madrid, compôs o criticado quarteto na vaga de um dos titulares. A goleada sobre o Chile nas eliminatórias por 5 a 0 (na vaga de Ronaldinho) e a própria final da Copa das Confederações de 2005 (no lugar de Ronaldo) são os dois melhores exemplos.
A segunda rodada foi marcada por outra vitória sem qualquer brilho do Brasil. Desta vez por 2 a 0, sobre a Austrália, e mais uma vez com o Quadrado Mágico sendo desmontado durante os 90 minutos. O Fenômeno saiu aos 27 minutos para a entrada de Gilberto Silva, com a seleção vencendo por 1 a 0, gol de Adriano. No mesmo minuto, Robinho entrou na vaga de Emerson, enquanto Adriano saiu aos 43 para Fred entrar e fazer o segundo gol.
Ronaldo estava muito acima do peso. Apresentou-se assim para a preparação e teve que perder cinco quilos para entrar minimamente em forma. Era um dos mais criticados pelas atuações, mas perseguia o recorde de gols de Gerd Müller. Desencantou no terceiro jogo.
Com o Brasil classificado, Parreira mandou ao campo do Borussia Dortmund um time misto, com Robinho na vaga de Adriano e a manutenção dos outros três craques no ataque. Ronaldo fez o primeiro e o quarto da goleada por 4 a 1 e se igualou ao atacante da seleção alemã com 14 gols em Copas do Mundo.
A tranquila classificação contra Gana, nas oitavas de final, novamente com o Quadrado Mágico em campo, devolveu parte da confiança que tinha sido perdida pela equipe. O Fenômeno abriu o marcador e se tornou isoladamente o maior artilheiro na história da competição; o Imperador fez o segundo gol, enquanto Zé Roberto fechou a conta.
Tragédia anunciada
Pela frente nas quartas de final, o adversário que mais impõe péssimas lembranças à seleção brasileira. As Copas de 1986 e 98 foram intensamente lembradas nos dias anteriores ao confronto, que aconteceu em primeiro de julho de 2006, na casa do Eintracht Frankfurt.
Carlos Alberto Parreira sabia que precisaria mudar para tentar bater os franceses. Seu 4-4-2 com o Quadrado Mágico não funcionara até então.
O grande problema tático envolvia as funções de Kaká e Ronaldinho, além do posicionamento de Adriano e Ronaldo. O ex-meia do São Paulo flutuava da direita para dentro e tinha a responsabilidade defensiva de fechar a segunda linha junto com Emerson e Zé Roberto, bastante sobrecarregados sem a bola. Já o craque do Barcelona era um meia avançado, que teoricamente ocupava o setor esquerdo também. Não havia entrega defensiva dele para colaborar com o meio-campo, e não era algo que ele precisava fazer com essa regularidade no Barça.
Na frente, Ronaldo e Adriano batiam cabeça. Sem a mesma mobilidade e velocidade de outrora, o atacante do Real Madrid brigava por espaço com o companheiro, que vivia um grande momento na Internazionale. Simplesmente não funcionou.
Para colaborar com o fracasso, Cafu e Roberto Carlos, 36 e 33 anos respectivamente, não conseguiram jogar no nível que todos sempre se acostumaram a vê-los. Assim, os corredores pela direita e pela esquerda não eram preenchidos, e o Brasil perdia força ofensiva e ainda deixava os dois laterais muito expostos pela falta de combate no meio-campo. Em diversas situações, o time era obrigado a marcar com seis jogadores e não com pelo menos oito na fase defensiva organizada, como deveria acontecer em um 4-4-2.
"Faltou mais preparação na parte física e mais entrosamento". Essa foi uma das explicações de Parreira após o 1 a 0 para a França. Falha da comissão técnica na elaboração e na execução do planejamento para a Copa.
Dida, Cafu, Lúcio, Juan e Roberto Carlos formaram a linha de defesa. Emerson se machucou contra Gana, mas se recuperou; mesmo assim, foi substituído na formação inicial por Gilberto Silva, que jogou atrás de Zé Roberto e Juninho Pernambucano. O ídolo do Lyon ficou com a vaga de Adriano. Kaká se tornou o meia ofensivo do time, enquanto Ronaldinho Gaúcho foi deslocado para o ataque, com total liberdade com e sem a bola. Ronaldo foi o centroavante.
A mudança tática para o 4-3-1-2 não tornou o Brasil melhor ou organizado em campo. Adriano entrou aos 18 do segundo tempo, já com o placar adverso após o gol de Thierry Henry na falha de marcação dentro da área brasileira. O Quadrado Mágico teve seu último suspiro, por apenas 16 minutos, até Kaká dar lugar a Robinho.
Foram 11 finalizações da França contra nove do Brasil, quatro a um no alvo. Atuação soberba de Zidane e o fim de uma história que entrou no imaginário popular como grande, mas que jamais triunfou.
Fonte: Gustavo Hofman, em casa
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