Após Paulista e Brasileiro, meninas do Centro Olímpico conquistam o continente

Julia Vergueiro
Julia Vergueiro

COTP premiação Paraguai
COTP premiação Paraguai Reprodução/Conmebol

“Eu sou de um time que não entra só quem quer/
A raça é muito grande, jogamos pra valer/
Eu tenho uma mania que já era tradição/
De nunca se entregar e nem cair ao chão/
Centro Olímpicoooo”

Quem acompanha as equipes do Futebol Feminino do Centro Olímpico nas competições certamente já se deparou com esse grito de guerra. E elas não cantam ele à toa, cantam só quando são campeãs. Mas como no caso estamos falando da base mais vitoriosa do Brasil nos últimos anos, a cantoria virou recorrente, e eu mesma já decorei a música de tanto escutar (e cantar junto, é claro!).

O exemplo mais recente e emblemático dessa enxurrada de conquistas veio no último sábado, em solo paraguaio: a equipe sub-14 do Centro trouxe pra casa o caneco do torneio que as próprias jogadoras “apelidaram” de Libertadores.

Seguindo os moldes da Libertadores na década de 1960, foram reunidas as 10 campeãs nacionais das confederações filiadas à Conmebol (Argentina, Brasil, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela) para a disputa da segunda edição da Fiesta Sudamericana de la Juventud, torneio promovido pela Conmebol com o intuito de fomentar o futebol de base na América do Sul, feminino e masculino. Os jogos rolaram entre os dias 25/01 e 02/02 em Assunção, no Paraguai, com direito a festa no Centro de Convenções e visita ao Museu da entidade sulamericana.

O representante do Brasil na categoria sub-14 foi o Centro Olímpico, que conseguiu a vaga em dezembro do ano passado ao sagrar-se campeão brasileiro em cima do Fluminense. Após uma campanha impecável, as meninas do Centro bateram as cariocas nos pênaltis e entraram de férias já com a cabeça na viagem para o Paraguai, como conta a capitã do time, Julia Brito:

“Não foi o nosso melhor jogo, a gente tava bem nervosa, tanto que acabou indo pros pênaltis. Quando acabou e saímos de férias eu não via a hora de voltar a treinar e começar a preparação pra Libertadores”.

COTP comemoração Paraguai
COTP comemoração Paraguai Arquivo Pessoal

A campanha no Paraguai

O Centro Olímpico caiu no grupo B, que tinha como cabeça de chave a equipe da casa, a Selección Estudiantil de Ñeembucu, além da SecaSports (Venezuela), Iquique (Chile) e Lavalleja (Uruguai).

O jogo de estreia do time brasileiro foi contra as venezuelanas. Debaixo de um sol de 37 graus, as meninas fizeram um jogo muito disputado e venceram o SecaSports por 4x3. Passado o nervosismo da estreia, as atletas do Centro conseguiram mostrar que a união entre elas e a preparação feita com muita competência por toda a comissão técnica fariam a diferença no placar: com duas goleadas, 6x0 contra o Iquique e 5x0 contra o Lavalleja, se classificaram para as semifinais com uma rodada de antecedência.

“Eu acreditava bastante no nosso time e a comissão nos deu vários vídeos para conhecermos as equipes adversárias, então eu tava bem confiante. Nosso time se entende muito bem dentro de campo, temos muita união e principalmente muita vontade de ganhar” – conta com alegria na voz a capitã Julia Brito, que se orgulha de poder ser um ponto de referência para as colegas de time – “Elas sempre vem me pedir ajuda, dentro e fora de campo, e eu tenho conseguido ajuda-las”

Na semifinal, o adversário foi a equipe do Espuce (Equador), que pouca resistência ofereceu, permitindo mais uma goleada para o Centro (5x0) e a vaga na grande final.

A decisão foi entre as duas melhores campanhas da competição, Centro Olímpico e Liga Antioqueña (Colômbia). Mais confiantes do que nunca, a equipe do Brasil não deu chances às adversárias colombianas, vencendo por 3x1 e levando junto com o título os prêmios individuais de melhor goleira (Isabella Cruz), melhor jogadora (Milena Ferreira) e artilheira (Milena Ferreira).

Mais do que um time de camisa, um time referência

O desempenho e os resultados da equipe no sulamericano foram tão positivos que surpreenderam os próprios organizadores da competição, os quais convidaram o supervisor técnico do clube, Rodrigo Coelho, a palestrar em um curso de treinadores da Conmebol que acontecia concomitante à competição.

A conquista do campeonato continental coroa uma geração muito vitoriosa e histórica no futebol brasileiro de base, que também conquistou o último Campeonato Paulista sub-14 (2018), o Campeonato Brasileiro sub-14 (2018) e o Mundial sub-12 (2017).

“Nós conversamos muito com as meninas sobre a importância do campeonato e estabelecemos com elas dois objetivos: o primeiro era ser campeão, claro, e o segundo era ir para a Disney, já que várias não tem condições de sair do país e mereciam isso. Elas tem entre elas isso de querer dar o melhor uma para as outras, não só para vencerem, mas para poder ajudar em outras coisas. Essa motivação mais pessoal acaba sendo uma corrente que as deixa mais próximas e mais fortes”, conta o treinador da equipe Douglas Matsumoto.

Com o título, o Centro Olímpico conquistou o direito de disputar a Disney Cup em Orlando, nos Estados Unidos, em julho de 2019. Algo me diz que o Brasil estará muito bem representado por esse grande clube e por essas pequenas grandes atletas.

COTP campeão Paraguai
COTP campeão Paraguai Arquivo Pessoal

(Agradecimento especial às famílias das atletas campeãs Julia Brito, Luisa Fontes e Manuela Gorny pelo carinho ímpar comigo desde que tive a sorte de participar um pouquinho da vida dessas meninas incríveis. Grande beijo!)

Fonte: Júlia Vergueiro

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Uma história sobre como o esporte ensina meninas a serem corajosas

Julia Vergueiro
Julia Vergueiro

Copa Nescau 2018
Copa Nescau 2018 Pelado Real/Grazielle Franco

“Que oportunidade incrível para ela quebrar esse medo de fracassar. Obrigada!”

Essa foi a frase que a mãe de uma das minhas melhores atletas sub-12 me disse, sorrindo, momentos após vencermos a semifinal da Copa Nescau há cerca de duas semanas. A disputa foi para os pênaltis e a filha dela foi escolhida pra ser a terceira a cobrar. Se ela fizesse, nós estaríamos na final. E ela fez.

No tempo regular, essa mesma atleta havia tido um momento de muito medo. Nós saímos atrás no placar e o jogo estava difícil. Pra piorar, esse era o mesmo campeonato do qual havíamos sido eliminadas ano passado, e ela, sempre muito competitiva, certamente não queria perder de novo. Quando finalmente empatamos, ela começou a se sentir mal. Enquanto comemorávamos o nosso gol, ela chorava e dizia que o estômago estava queimando, e então a levei até a enfermeira enquanto o jogo seguia. Pra conseguir acalmá-la, saímos do ginásio, que naquele momento estava absurdamente barulhento refletindo a emoção da torcida e dos times que lutavam pela vaga na grande final.

Do lado de fora, essa mesma mãe veio nos encontrar e perguntou o que houve. Ela tinha nos visto saindo da quadra e veio correndo da arquibancada ao nosso encontro. Bastou alguns segundos de conversa e ela logo captou o que estava ocorrendo, e não teve dúvidas em dizer: “filha, isso que você está sentindo é vontade de ganhar. Agora volta lá e enfrenta isso porque o time precisa de você”. Nossa pequena craque engoliu o choro e, sem contestar, seguiu direto de volta pro jogo. Minutos depois ela estaria cobrando o pênalti decisivo, com uma convicção única, e correndo pro abraço das colegas pra comemorar a classificação. Adeus, medo. Hoje, eu te venci.

Mesmo depois de vencermos a final e levarmos o título histórico pra casa, em uma partida que mereceria um texto à parte, esse foi o momento que mais me marcou. Essa mãe soube mostrar à sua filha que a gente nunca vai saber o tamanho do nosso medo até enfrenta-lo, e que ter a coragem de fazê-lo é o que mais importa.

Essa história não é sobre o sabor da vitória, é sobre o processo de encarar um desafio de frente. É sobre não desistir quando achamos que iremos fracassar.

(Os pênaltis da semifinal da Copa Nescau 2018) 

Quantas vezes na vida nós, mulheres, tomamos uma atitude verdadeiramente corajosa? Quantas vezes fazemos uma escolha sem nos preocupar em sermos perfeitas naquilo? Meninas não são ensinadas a arriscar, e assim nos tornamos mulheres habituadas a buscar apenas os caminhos em que já sabemos que somos boas.

E não é que não sejamos boas para as outras opções, mas não estamos acostumadas a enfrentar desafios. Estamos acostumadas a sermos ótimas, excelentes, e por isso desistimos mais rápido quando lidamos com uma situação na qual achamos que não vamos atingir esse nível de perfeição.

“Um relatório da HP descobriu que homens candidatam-se a um emprego se atenderem apenas 60% dos pré-requisitos. Mas as mulheres? As mulheres se candidatam apenas se tiverem 100% dos pré-requisitos”. Escutei esse dado em um TED intitulado “Ensine coragem às meninas, não perfeição”, apresentado pela empreendedora Reshma Saujani, fundadora do “Girls Who Code”, um projeto que educa meninas a aprenderem a programar, uma função de pura tentativa e erro.

O esporte é uma ferramenta maravilhosa para ensinar nossas meninas a serem corajosas. A enfrentarem o medo de entrar em quadra, diante de centenas de torcedores, e correr o risco de não ganhar. A arriscar um chute ou um drible diferente, mesmo sabendo que pode não dar em nada ou que pode até acabar gerando um contra-ataque pras adversárias. A escolher bater o pênalti decisivo e carregar nas costas o peso de poder ser quem salvou ou quem desperdiçou o sonho do time e de toda a torcida.

Metade da população mundial é feminina. Se estamos criando as meninas para serem perfeitas e os meninos para serem corajosos, estamos desperdiçando 50% do potencial da nossa humanidade. Logo, comecemos hoje a fazer como a mãe da minha atleta e digamos às meninas que conhecemos para encararem seus medos de frente e sentirem que o sabor da coragem é muito mais gostoso do que o da perfeição.


Fonte: Júlia Vergueiro

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