O depois do #DeixaElaTrabalhar: a opinião de Bibiana Bolson sobre os rumos do manifesto
Não é novidade o assédio, o machismo, o sexismo dentro das redações, no estádio, no treino, no ambiente esportivo em geral, na sociedade. Porém, é sim inédito um movimento de união dessa grandeza no jornalismo esportivo brasileiro. Somos muitas vozes, atuando em diversas empresas, diariamente, desconstruindo a ideia de que existe um lugar ou uma função para as mulheres. Vozes potentes que fazem barulho, vozes que precisavam muito gritar!
O #DeixaElaTrabalhar surgiu como a resposta a dois casos recentes de machismo/assédio (acontecimentos com as repórteres Bruna Dealtry, do Esporte Interativo, e Renata de Medeiros, da Rádio Gaúcha), mas nasceu, também, num contexto de urgência. É urgente que tenhamos movimentos legítimos em defesa das causas das mulheres!
Sem partido político, sem patrocínio de empresa alguma, sem interesses que não sejam exclusivamente os de termos um ambiente sadio, de igualdade e de respeito. Somos, em nossas múltiplas trajetórias profissionais, mulheres com experiências diversas, mas com histórias semelhantes, só que de roupagens diferentes.
A jornalista que foi assediada pelo chefe. A repórter que foi preterida na pauta por ser mulher. A que foi descartada de situações profissionais por ter tido filho. A que não pôde crescer por méritos baseados apenas no trabalho e não nos padrões de beleza. A produtora que foi demitida depois de não aguentar as ofensas morais dos colegas. A editora que foi desacreditada por contar o que aconteceu no estádio. A que recebe ofensas nas redes sociais. Cantadas no WhatsApp. A que já foi cuspida. Agredida. Ameaçada de estupro. A apresentadora que precisava usar roupas mais justas para chamar atenção dos telespectadores. A jornalista que tem que, diariamente, provar conhecimento, mostrar que se preparou, que estuda, que sabe. Somos todas essas mulheres. A repórter que convive com piadinhas. No singular e no plural dos relatos, somos todas essas mulheres. Nas peculiaridades de cada caso, de cada vivência, e somos muitas.
Uma das participantes do manifesto, Paula Ab, já passou pelas principais redações do Brasil (em todas sofreu algum tipo de assédio ou machismo), destacou sobre a sororidade do #DeixaElaTrabalhar. “A gente já tentou outras vezes, mas sempre sem muita força, abafado de alguma forma. Me comovo e nunca vi nada parecido. Um grupo de 10 pessoas, que virou 50, 100 e agora milhares. É um trabalho de formiguinha, sabemos disso, mas é uma sensação diferente, de companheirismo, de união”.
Além disso, a jornalista pontuou algo muito importante e que compartilho do mesmo pensamento: “Por que a gente tem que carregar esse peso dessas situações todas sozinhas? A gente tem que dividir isso com quem causou. Sei que não vai mudar o pensamento de muitos, mas vai, ao menos, chamar a atenção, provocar a reflexão, está mexendo com eles também. Por isso, não é mais um movimento”.
A jornalista Taynah Espinoza, também participante do #DeixaElatrabalhar, reforça a mesma ideia. “Acho que esse é um manifesto diferente porque conseguimos juntar meninas de diferentes emissoras e posições, mas todas com um mesmo propósito. A gente precisava fazer barulho, precisava chamar atenção para algo que acontece quase que diariamente em estádios, redações e na rua”.
Segundo a jornalista Mariana Fontes, a reflexão é ponto chave nessa repercussão. “A gente precisa lembrar que o cara que assedia no estádio, que tenta um beijo, que ofende, que é machista, ele está igualmente representado em todas as redações. É o que faz comentário desrespeitoso, ofensivo, engraçadinho. É fácil compartilhar um lindo vídeo, mas e a reflexão?! Não adianta fingir que esse vídeo não está falando para ‘você’. Está, sim, falando com ‘você’ e de ‘você’. Temos que refletir, também, sobre as representatividades das atuais lideranças dentro de uma redação. Qual a chefia/mulher que vai te ouvir e entender o novo momento da sua vida, por exemplo, quando você for mãe? Esses temas precisam ser pensados. As decisões e as condutas que representam a sociedade.”
De fato, com o #DeixaElaTrabalha, chamamos a atenção dos principais meios de comunicação do Brasil. Não passamos despercebidas nas redes sociais, onde, desde domingo, alcançamos um número incrível de compartilhamento e de mensagens. Milhões delas de internautas “desconhecidos” e de figuras públicas muito relevantes. Mobilizamos os clubes brasileiros. Paramos o Maracanã com a exibição do nosso vídeo de mais de dois minutos de manifesto. Despertamos o interesse de renomados jornais internacionais, portais esportivos e canais de televisão. Recebemos o apoio de colegas, jornalistas da Argentina, da Itália, da Colômbia, da Espanha, da França..
É um momento único, que nos fortalece e nos estimula a fazer dessa campanha um projeto de continuidade. De ações, de debates e de efetividade. Torço para que não tenhamos feito história apenas pelas nossas vozes, rostos, palavras expostas pelo mundo inteiro com uma forte mensagem. Espero que tenhamos despertado um novo momento e que consigamos resultados merecidos e necessários daqui para a frente.
É chegada a hora de reflexão para aqueles que são protagonistas nos casos de machismo, de assédio, nas condutas preconceituosas e sexistas, mas que seja também o momento de responsabilização desses e daqueles que, de alguma forma, se escondem em cargos, em funções, em relações de comando. Que o ineditismo dessa ação no jornalismo esportivo se estenda para outros segmentos da sociedade, sirva de incentivo para outras mulheres falarem sobre suas lutas.
#DeixaElaTrabalhar
O depois do #DeixaElaTrabalhar: a opinião de Bibiana Bolson sobre os rumos do manifesto
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